terça-feira, 30 de junho de 2009

JOÃO, O APÓSTOLO DO AMOR E SEUS ESCRITOS" Parte 4

A. A Mensagem de João 

"Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram  registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que crendo, tenhais vida em seu nome".  João 20.30,31

João 20.30,31 e o Propósito do Evangelho

 

“Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Este, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que , crendo tenhais vida em seu nome”.

Os manuscritos do texto grego de João variam levemente aqui, de um modo que tem permitido a alguns estudiosos argumentar que o propósito de João não era o de criar a fé, mas mantê-la. A variação afeta o tempo do verbo traduzido “para que creiais”. Alguns, manuscritos têm o tempo grego aoristo, que produziria a paráfrase “tenhais chegado à fé”. Outros têm um tempo presente, que resultaria em “podeis vir a crer”, e que pode, portanto implicar que João escreveu com os cristãos em mente, tentando apoiá-los e fortalecer  sua fé.

Entretanto, mesmo que o tempo presente seja correto, a paráfrase poderia igualmente ser “podeis vir a crer e continuar na fé”. O tempo presente é usado com este sentido em João 6.29, dirigindo-se aos não-crentes. 

Certamente o Evangelho de João sustenta e fortalece a fé dos crentes, e tem sempre feito isto. Certamente, isto parece ser parte de seu propósito. Mas o plano de João é mais amplamente exteriorizado  do que meramente isto. De 20.30,31 podemos inferir três aspectos a respeito de seu propósito;

1.      Os “sinais” desempenham um papel vital em seu Evangelho porque pode de persuadir seus leitores a crer.

2.      Ele tem os judeus particularmente em sua mente, porque eles precisam aprender que Jesus é “o Cristo”, isto é, o Messias.

3.      Ele quer que a fé cresça da fé intelectual que Jesus é o Cristo para a fé experiencial que significa “vida em seu nome”.

B. Os fundamentos da fé

O caminho para a vida é a fé, 3.14-16,36; 6.47; 20.31.      Mas sobre o que repousa a fé? João concordaria com a resposta dada por Paulo em Romanos 10.17: “ A fé vem pela pregação e a pregação pela palavra de Cristo”. A fé nunca está isolada. Ela é sempre uma resposta a uma iniciativa de Deus. Em particular, ela é despertada por sua palavra, ou, como João diria por seu “testemunho”. Crer no testemunho de Deus, dado através de Cristo, é tomar os primeiros passos vitais para a fé leva à vida eterna: acima de tudo, esta é a mensagem do Evangelho de João.

C. Que testemunho João apresenta?

Testemunho humano. Nas palavras de abertura do Evangelho, como naquelas da primeira carta e de Apocalipse, João traz seu próprio testemunho sobre o Senhor Jesus Cristo: “Vimos a sua glória”, 1.14. Assim, ele inicia seu Evangelho com uma afirmação, não com uma prova. Do mesmo modo do Gênesis traz como introdução “No princípio... Deus”, anunciando a existência do Pai, assim o Evangelho de João tem como introdução “No princípio era o Verbo”, afirmando a preexistência do Filho de Deus"

Estas verdades eternas são produto da revelação   divina, não da especulação humana. Agora, porém, são elas comunicadas pelo apaixonado testemunho de seres humanos, que se tornaram convencidos delas. O Evangelho começa e termina com esta nota de testemunho apostólico ( compare com 21.24). Nos capítulos interpostos temos uma sucessão de pessoas que se encontram com Jesus e dão testemunho sobre Ele:

·  O testemunho de João Batista é introduzido juntamente com o de João no começo, 1.6-8, e é o mais elaborado ( vide 1.19-36;3.25-30;10.40-42), talvez porque João Batista era amplamente reconhecido como um profeta pelos judeus nos dias do apóstolo João.

·  Uma sucessão de discípulos encontram Jesus e dão testemunho, 1.37-51; André convence seu irmão Simão, e Filipe traz Natanael o qual faz então uma expressiva confissão de fé, 1.49.

·  Os samaritanos dão um forte testemunho no capítulo 4: primeiro a mulher torna-se convencida de que Jesus é “o Messias” ,4.29, e depois seus compatriotas afirmam que Jesus é o “Salvador do mundo”, 4.42

  •     Pedro, 6.68,69, a multidão em Jerusalém, 7.40-42, o homem nascido cego, 9.17 Marta, 11.27, e Tomé, 20.28, todos dão diferentes testemunhos de Jesus, dependendo  de suas diferentes experiências com Ele. A confissão de Tomé compõe um vigoroso clímax de toda a história.

·  Pedro, 6.68,69, a multidão em Jerusalém, 7.40-42, o homem nascido cego, 9.17, Marta, 11.27, e Tomé, 20.28, todos dão diferentes testemunhos de Jesus, dependendo  de suas diferentes experiências com Ele. A confissão de Tomé compõe um vigoroso clímax de toda a história.

Para decidir isto, é necessário apresentar evidência, e testemunhos posteriores são requeridos. Embora essas testemunhas humanas sejam importantes, Jesus não depende de seus testemunhos para avaliar suas reivindicações, 5.34. Ele até aceita o princípio legal: “Se eu testifico a respeito de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro” 5.31. Nos tribunais judaicos nenhum testemunho  podia ser aceito a menos que fosse corroborado.

Os fariseus lançaram isto a Jesus em 8.13: “Tu dás testemunho de ti mesmo, logo o teu testemunho não é verdadeiro”. Porém Jesus aceita este repto e replica: “ Também na vossa lei está escrito que o testemunho de duas pessoas é verdadeiro. Eu testifico de mim mesmo, e o Pai, que me enviou, também testifica de mim”, 8,17,18.  E assim uma Segunda testemunha é convocada:

b. Testemunho divino. O Dr. A. E. Harvey[1] esclarece o significado de Ter Jesus chamado a Deus para testemunhar em 5.37 e 8.18 cp 8.50; 10.32. Nas cortes judaicas, o testemunho solitário podia ser aceito se acusado invocasse solenemente a Deus para testemunhar que sua declaração era verdadeira. Este era um passo sério a ser tomado porque, se estivesse de fato mentido, o acusado expunha-se ao julgamento de Deus. E, de modo oposto seus acusadores teriam de pensar duas a três vezes antes de repetir sua acusação, porque ele também podiam opor-se a Deus e atrair o julgamento sobre si mesmos.


[1] O Dr, Harvey tem mostrado proveitosamente, em seu livro Jesus sob Julgamento, como figura do tribunal de justiça permeia todo o Evangelho de João. João apresenta sua narrativa do ministério de Jesus como se Ele estivesse em julgamento do começo ao fim, e não apenas no final diante do sumo sacerdote. Na realidade, neste Evangelho Jesus nunca é formalmente julgado. Ele é executado sem o devido processo da lei, muito embora Ele mesmo pleiteasse que testemunhas fossem convocadas quando compareceu diante do sumo sacerdote, 18.21. O julgamento ocorre neste sentido informal, através de todo o livro modo que os leitores de João são eles mesmos colocados em cena e compelidos a vir por sua própria decisão

Este é o espírito pelo qual Jesus invoca a Deus por testemunha em seu favor. Em qualquer caso, a natureza da reivindicação de Jesus é tal que somente Deus podia autenticá-la e apoiá-la: Jesus alega ser o Filho, unicamente autorizado a dar vida e exercer o julgamento, ambas prerrogativas do próprio Deus, 5.19 –23. Assim, é não somente um passo corajoso, mas essencial em seu caso, que Jesus deva citar a Deus como testemunha em seu favor.

Eles perguntam, como os opositores de Jesus fazem, como Deus dá testemunho de seu Filho (p.ex., 8.19. Este testemunho divino, diz Stott, responde João, é triplo.:

 

i.  O Pai profere seu testemunho por meio dos lábios de Jesus. Repetidas vezes Jesus nega que exponha suas palavras por sua própria autoridade. Sua autoridade é derivada do Pai que é seu autor. Não é Ele próprio a Palavra do Deus encarnado, 1.14 ? Então suas palavras são as palavras de Deus, 2.34:

·         “ O meu ensino não é meu, e sim daquele que me enviou” 7.16

·         “Nada faço por mim mesmo; mas falo como Pai me ensinou” 8.28

·         “Eu não tenho falado por mim mesmo, mas o Pai que me enviou, esse me tem prescrito o que dizer e o que anunciar... As coisas, pois, que eu falo, como o Pai me tem dito, assim falo” 12.49,50  .. Eu lhes tenho dado a tua palavra” 17.8,14.

Jesus espera que todos os que o ouvem creiam em suas palavras, porque Elas são as palavras de Deus. Ao fazer esta solene afirmação, Ele está  deliberadamente aludindo à famosa promessa dada a Moisés em Deuteronômio 18.18: “Suscitar-lhes-ei um profeta do meio de seus irmãos, semelhante a ti, em cuja boca porei as minhas palavras, e ele lhes falará tudo o que eu lhe ordenar”.

João, naturalmente, acredita que Jesus fale as palavras de Deus não apenas porque Ele é um “profeta como Moisés”, que as pessoas estavam esperando, cp. 1.21, mas porque Ele é muito mais que um profeta: Ele é a própria “Palavra de Deus” em pessoa. Mas como tal ele cumpre a profecia de Deuteronômio 18, e seus leitores precisam ser postos em seus lugares: eles o escutarão?

Em relação a isto é digna de ser considerada a admirável nova designação de Deus no Evangelho de João como “aquele que me enviou”. Estas paráfrases dos nomes “Pai” e “Filho” quase sempre ocorrem em contextos em que a autoridade do Filho é desafiada ou a do Pai é reivindicada. “Aquele que enviar” sustenta a autoridade de “quem Ele enviou”:

·          “O enviado de Deus fala as palavras dele”, 3.34.

·         “Aquele que me enviou e verdadeiro, de modo que as coisas que dele tenho ouvido, essas digo ao mundo”, 8.26.

·         Jesus, pois, enquanto ensinava no templo, clamou:...”não vim porque eu  de mesmo quisesse, mas aquele que me enviou é verdadeiro, aquele a quem vós não conheceis. Eu o conheço, porque venho da parte dele e fui por ele enviado, 7.28,29.

"JOÃO, O APÓSTOLO DO AMOR E SEUS ESCRITOS" Parte 3

1. Teria João, mudado profundamente por Jesus?

João e Tiago, de acordo com Marcos, foram apelidados, como já comentamos anteriormente, por Jesus “Boanerges” que significa “filhos do trovão”, e vários incidentes nas narrativas do Evangelho revelam seu temperamento tempestuoso. É João quem se irrita e proíbe o ministério do exorcista que não era um dos Doze.

São os dois filhos do trovão que juntos ofendidos com a recusa de uma aldeia samaritana de receber Jesus, e à semelhança de Elias, querem invocar fogo do  céu para  consumí-la. E são os mesmos irmãos que vêm com sua mãe pedir que  os melhores assentos  no Reino pudessem ser reservados para eles , Mc 10.35-45; Mt 20.20-28.

Quão pequenos pareciam eles então para compreender o espírito de Jesus ! Ele tem de repreendê-los: “Vós não sabeis de que espírito sois”, Lc 9,55, e novamente: “Não sabeis o que pedis” Mt 20.22; Mc 10.38. Entretanto este filho do trovão tornou-se por nós como “o apóstolo do amor”. É claro que o calor do sol do amor de seu Mestre fez com que se evaporassem as nuvens do trovão.

Agora ele está mais do que aberto ao ministério de outros fora dos Doze: a mais eficiente evangelista em seu Evangelho é a mulher samaritana, 4.39. E agora ele mostra os samaritanos sob a luz mais calorosa possível: eles excedem os judeus em resposta de crença em Jesus, 4.42, e ‘instam’ com Jesus para ficar com eles, 4.40. E agora, longe de procurar reconhecimento e posição ao lado do Senhor, ele apaga completamente seu nome da história e dá a si mesmo um novo nome; o que registra o único epitáfio que ele deseja: esqueça todo o eu, fui amado por Jesus! 

João foi assim eminentemente apropriado a comunicar o coração de seu Senhor. Ele desejou apresentar seus leitores à Pessoa que ele veio a conhecer e amar. Ele queria que também tivessem comunhão com  Ele, 1 Jo 1.3, e esperava que eles tivessem seu caráter transformado como ele teve.

Na realidade, ele explica claramente os propósitos para os quais escreveu. Ele escreveu seu Evangelho para que seus leitores cressem em Jesus e experimentassem a vida por meio da fé nele, 20.31, e escreveu  sua primeira carta àqueles que já acreditavam, para que pudessem saber que tinham vida, 1 Jo 5.13. Sua teologia é profunda e desafiadora, mas seu propósito supremo é prático. Ele quis que seus leitores recebessem a vida eterna e ao mesmo tempo soubessem que já receberam.

Para que seus leitores recebam a vida eterna devem por sua confiança em Jesus Cristo, uma vez que nele está a vida, 1.4. Portanto, em seu Evangelho e em quem podemos crer. Em  particular, ele parece ter dirigido sua obra aos judeus, enfatizar o meio pelo qual Jesus cumpre e substitui todas as grandes instituições do Judaísmo – o templo, a lei, as festas anuais. O templo e sua adoração se perdem, destruídos pelos romanos no ano 70 d.C.; depois dessa data o Evangelho de João poderia ter tido um apelo significativamente poderoso para os judeus, cuja tristeza se converteu em alegria pela descoberta de que Deus já havia reparado aquela perda através de Jesus.

 

segunda-feira, 29 de junho de 2009

"O Brasil precisa de pastores de caráter limpo!"

O caráter de um pastor define o seu ministério. Isso significa que um pastor cujo caráter é íntegro produzirá um ministério limpo, cheio de graça e de verdade, um ministério sem nebulosidades. Contudo, um pastor sem caráter, invariavelmente, produzirá um ministério fajuto, de mentirinha, caracterizado pela arrogância, vaidade, roubos (não só financeiros, mas de tempo e de vidas), adultérios e neuroses pessoais pretensamente anunciadas como revelações de Deus. Cuidado com ele!

Não adianta um ministério aclamado pelos homens, mas reprovado por Deus. No final, o que conta mesmo é a minha, a tua vida diante de Deus. Quando se trata de liderança pastoral há um trecho da palavra de Deus que muito me chama a atenção. É o texto de Mateus 7.21-23, que diz: “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade.”
O curioso nesse texto é que todas as pretensas realizações alegadas pelos que estão sendo reprovados no juízo final são funções associadas à liderança pastoral: profecias, expulsão de demônios, realização de milagres. Só líderes no reino de Deus realizam tais tarefas. O Senhor, entretanto, os reprova, pois o coração desses líderes não era limpo, seu testemunho era condenável, suas motivações mais íntimas eram mesquinhas e egoístas. Foi sob esta perspectiva que Deus falou ao profeta Samuel: " ...o Senhor olha para o coração...".
Na verdade, esses líderes tomavam o nome de Deus em vão todas as vezes que realizavam milagres, profetizavam ou expeliam demônios, pois no dia-a-dia “praticavam a iniqüidade= qualidade ou caráter do iníquo;grande injustica, pecado, crime, perversidade”, promoviam a si mesmos.
Jesus, no sermão do Monte, entre outras bem-aventuranças, declarou que são “bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus” (Mt 5.8). Deus se importa muito com um coração limpo. Por essa razão, Jesus inclui os limpos de coração em suas bem-aventuranças.
O pastor precisa indiscutivelmente ter coração limpo se deseja servir a Deus com integridade e um testemunho pessoal aprovado. Davi escreve “Quem subirá ao monte do Senhor? Quem há de permanecer no seu santo lugar? O que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à falsidade, nem jura dolosamente” (Salmo 24.3-4).
Ele descreve, neste Salmo, pelo menos quatro caracterísitcas marcantes que deve ter o pastor, o cidadão do céu:
  1. Mãos limpas
  2. Coração puro
  3. Não entregar alma à falsidade
  4. Não jurar dolosamente
Por isso, o líder da igreja, deve conservar o “mistério da fé com a consciência limpa” (1Tm 3.9).Manter um bom testemunho por ter um coração limpo não necessariamente fará do pastor um sucesso entre os homens, o pastor não deve pretender ser pop. Pelo menos enquanto este pastor estiver vivo; se bem que o viver de qualquer cristão, seja ele, pastor ou não, deve ser de "vivo-morto", mais tarde ele , de acordo com seu modus-vivendis, estará "morto-vivo".
Depois de morto é outra história. Não obstante, é o bom testemunho que fará desse líder um vitorioso diante do Seu Senhor, pois Deus sabe que o bom testemunho agrega as ovelhas, enobrece o reino de Deus, honra o nome do Senhor, não escandaliza os mais fracos na fé.
Portanto, cabe a cada líder pastoral avaliar diariamente como está o seu coração. Esse exercício devocional é imprescindível para ser bem sucedido no ministério da Palavra, pois somente os limpos de coração verão a Deus e, assim, serão considerados bem-aventurados.
Fonte:www.institutojetro.com
com adaptações do editor deste blog

" JOÃO, O APÓSTOLO DO AMOR E SEUS ESCRITOS" Parte 2

Questões, consenso entre os estudiosos.

A. A Linguagem de João.

É notório que não existe diferença estilística entre os discursos que Jesus profere e as partes narradas do Evangelho, pelas quais o evangelista é responsável. Entretanto, devemos lembrar que Jesus não ensinou em grego. Ele usou o aramaico, e, portanto todos os nossos registros de seu ensino resultam de tradução. É bem conhecido o fato de duas traduções do mesmo original diferirem grandemente uma da outra porque o estilo e o vocabulário da tradução são escolha do tradutor.

Vem de longa data a constatação de que o grego de João tem muitas características hebraicas e aramaicas, de modo que o autor é claramente bilíngüe. Além disso, se é verdade que João queria transmitir a essência interior do ensino e da pessoa de Jesus, não é de surpreender que a linguagem dos discursos reflita o próprio estilo de João.

B. A Estrutura de João

O próprio autor revela o cuidado com que compôs seu Evangelho. Ele o descreve em termos de seletividade: “Na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome”, 20.30,31.

Como podemos ver, a estrutura e mensagem do livro focalizam os “sinais”, os atos miraculosos de Jesus que indicam além deles as verdades sobre sua pessoa. Estes “sinais” particulares – todos exceto um exclusivo em João – foram escolhidos com um propósito peculiar – o de convencer seus leitores a crerem em Jesus como “o Cristo”.

C. Se João é o autor do Evangelho, o que podemos dizer sobre ele?

1. Teria sido testemunha ocular de Jesus?

A despeito da aversão geral pela tradicional atribuição da autoria a João, estudiosos admitem que o autor exibe um conhecimento profundo da geografia da palestina ( p. ex., 1.28; 4.5,6,20), de Jerusalém ( p.ex., 5.2;19.13, do templo antes de sua destruição ( p.ex., 2.20;8.20;10.23), e do estado geral dos assuntos de Israel no tempo de Jesus.

A exatidão de João nestes aspectos deve certamente sugerir preocupação pela precisão em seu registro dos acontecimentos do ministério de Jesus – a maioria dos quais ele deve ter testemunhado diretamente, como um dos Doze. Suas narrativas são temperadas com alusões ao tempo e lugar, bem como com outros detalhes casuais, todos os quais nada acrescentam à história a não ser para sublinhar a implícita reivindicação de que o autor conhece intimamente seu material (p.ex., 1.39;2.1;3.23;4.6,40; 11.54;18.10;21.11).

2. Parece que João possuía um conhecimento íntimo de Jesus.

Em 21.24 o autor é identificado, não pelo nome, mas como “o discípulo que Jesus amava”, (compare com 21.20). Este “discípulo amado” é mencionado também em 13.23; 19.26; 20.2; e 21.7, e muitos estudiosos acreditam que ele é também o “outro discípulo” anônimo de 18.15,16. Em cada ocasião em que este discípulo aparece, a intimidade de seu relacionamento com Jesus é ressaltada.

Primeiro ele aparece reclinado à mesa perto de Jesus no cenáculo, tão próximo dele que pôde sussurrar ao seu ouvido sem ser ouvido pelos outros, 913.21-25; compare com 21.20) . Em seguida constatamos que, muito embora Jesus tenha predito que todos os discípulos o abandonariam, 16.32, este específico discípulo o acompanha até o pátio da casa do sumo sacerdote, 18.15. Na cruz Jesus confia a ele o cuidado de sua mãe, 19.25-27, e é ele a pessoa (novamente com Pedro) a quem Maria Madalena corre com a notícia do túmulo vazio, 20.1,2.

Finalmente, é o discípulo amado quem primeiro reconhece o Senhor ressurreto na praia da Galiléia e grita para Pedro: “É o Senhor!”, 21.7, e quem em seguida participa de uma conversa privada que o Senhor tem com Pedro após a refeição da manhã, 21.20-23.

Se este “discípulo amado” era João podemos completar este retrato de intimidade com os Evangelhos sinópticos. Pedro, Tiago e João formavam juntos um círculo íntimo dentro dos Doze, permitido por Jesus para testemunhar certos eventos cruciais. Eles vêem a ressurreição da filha de Jairo, Lc 8.51, testemunham sua glória no Monte da Transfiguração, Mc 9.2, ouvem seu ensino apocalíptico, Mc 13.3, e ficam ao lado dele em sua amarga agonia no jardim, Mc 14.33.

De modo geral, João desfrutou o máximo relacionamento íntimo com Jesus, e por isso estava mais qualificado do que qualquer dos Doze a transmitir a mente recôndita do Senhor. Ele o viu com seus olhos, 1 Jo 1.1-3; compare com 1 Jo 4.14 e João 1.14; ouviu-o com seus ouvidos e tocou-o com suas mãos, 1Jo 1.1-3. Ele havia absorvido a própria mente do Senhor, penetrado no coração de sua auto-revelação, e verdadeiramente captado o espírito de seu Mestre.

" JOÃO, O APÓSTOLO DO AMOR E SEUS ESCRITOS" Parte 1

Haja vista que, durante esse Trimestre, estudaremos na Escola Bíblica Dominical acerca da Primeira Carta do Apóstolo São João, resolvi postar algumas considerações que poderão ajudar no estudo e esboço sobre a vida e obras desse discípulo " a quem Jesus amava".

 João - O Evangelho de Cristo, o Filho de Deus.

A.[1]O autor

Do próprio Evangelho se podem deduzir alguns fatos a respeito do seu autor. Primeiro, era um judeu acostumado a pensar em Aramaico, embora o Evangelho tivesse sido escrito em Grego. Muito poucas cláusulas subordinadas aparecem no seu texto e são freqüentes as palavras hebraicas ou aramaicas nele insertas e explicadas a seguir. João estava familiarizado com a tradição judaica. Em 1.19-28 refere a expectativa judaica da vinda de um Messias.
Conhecia os sentimentos judaicos para com os samaritanos, 4.9, e a sua atitude exclusivista no culto, 4.20. Estava relacionado com as festas judaicas, que explicou cuidadosamente aos leitores. 
Segundo, era um judeu da Palestina, familiarizado com a terra e especialmente com Jerusalém e os seus arredores, 9.7;11.18;18.1. Estava familiarizado com as cidades da Galiléia, 1.44;2.1 e com o território de Samaria, 4.5,6,21. Parecia sentir-se em casa no país que descrevia.
Ainda, era testemunha ocular dos acontecimentos que descreveu. Tanto em 1.14, “vimos a sua glória...”, como em 19.35, onde falou na terceira pessoa, “aquele que isto viu, deu testemunho”, afirma dizer aquilo que tinha sido parte da sua experiência pessoal. Pequenas pinceladas espalhadas por todo Evangelho confirmam esta impressão.
A hora a que Jesus se sentou no parapeito do poço, 4.6, o número e o tamanho das talhas nas bodas de Caná, 2.6, o peso e o valor do perfume que Maria derramou sobre os pés de Jesus, 12.3,5 os pormenores do Julgamento de Jesus,  18 e 19, são pontos que têm pouco que ver com a narração principal, mas que indicam grande capacidade de observação.

B. Quem era João?

Esta é uma pergunta complicada e controvertida. O ponto de vista tradicional é que o Evangelho e as cartas foram  escritas já em sua idade avançada, em Éfeso, pelo apóstolo João, filho de Zebedeu. Esta interpretação remonta a Irineu, bispo de Lyon de 178 até sua morte em 195 d.C., aproximadamente. Irineu alegava ter uma ligação direta com João através de Policarpo, o bispo de Esmirna, martirizado em 156 d.C., aos oitenta e seis anos de idade.

Numa famosa carta conservada ( Na Soberania Única de Deus )  por Eusébio, o historiador da igreja, Irineu[2], conta a um amigo como, quando jovem, sentava-se aos pés de Policarpo e o ouvia discorrer sobre suas conversações com João e o ensino que recebera diretamente do apóstolo. Podemos bem imaginar Policarpo, com seus vinte anos, ouvindo o apóstolo João, que, por sua vez, devia estar então nos seus oitenta anos, parecendo haver pouca razão para duvidar da alegação de Irineu.

Quando, portanto, Irineu afirma que João, o filho de Zebedeu, Mc 1.19,20, (pescador da Galiléia ), e de Salomé, que era provavelmente irmã de Maria mãe de Jesus, ( Cf Mt 27.56;Mc 15.40;Jo19.25), escreveu o quarto Evangelho, e que ele era o “discípulo a quem Jesus amava”, o qual reclinava perto de Jesus na última ceia, 13.23, devemos considerar seriamente seu testemunho.

Embora o autor não tenha dito o seu nome, tomou por certo que os seus leitores sabiam quem era o autor e que aceitaram a sua autoridade nos assuntos sobre o que escreveu.

Os episódios da vida de Jesus de que João partilhou são demasiadamente numerosos para serem postos em lista e considerados separadamente. Esteve com Jesus em Jerusalém durante o primitivo ministério na Judéia. Talvez a entrevista com Nicodemos se tenha dado em sua casa. Tomou parte mais na missão dos doze, descrita em Mateus 10.1,2.

Precisou dos conselhos de Jesus tanto como qualquer outro dos doze, pois ele e Tiago parecem ter tido temperamentos invulgarmente fogosos. Jesus chamou-lhes “filhos do trovão”, ou traduzindo mais literalmente, “Filhos do  Tumulto”, Mc 3.17. Marcos não apresenta nenhuma razão pela qual esse nome lhes tivesse sido dado, mas o uso do idiotismo hebraico “filho de...”significava meramente que a palavra que completava a expressão qualificava o homem como “filhos de Belial” significava “pessoa sem valor”.

A sua intolerância e truculência revelou-se na sua prontidão em repreender o homem que expulsava demônios, porque não seguia com eles, Lc 9.49 e no seu desejo de chamar fogo do céu sobre as aldeias samaritanas que não recebiam Jesus, Lc 9.52-54. Também, precipitadamente, sua mãe pediu a Jesus que lhes garantisse lugares de primazia no Seu reino, Mt 20.20-28. Estas durezas de espírito, mesmo que fossem mantidas por um desejo de lealdade para com Ele e a Sua obra, foram severamente repreendidas por Jesus.

Na última ceia, João ocupou um lugar de privilégio e de intimidade junto de Jesus, Jo 13.23. No julgamento, obteve acesso ao tribunal do sumo-sacerdote, porque era conhecido dele, 18.15,16. Talvez tenha sido representante em Jerusalém de sociedades de pesca de seu pai e assim se tenha relacionado com todas as casas notáveis da cidade.

Segundo se vê , presenciou o julgamento e a morte de Jesus e assumiu a responsabilidade da mãe de Jesus, quando Jesus a recomendou aos seus cuidados, 19.26,27. Andou com Pedro durante os tristes dias do funeral, e foi, com ele, um dos primeiros a visitar  o túmulo vazio. Lá, ao olhar para as roupas no túmulo vazio “viu e creu”,20.8.


[1] Papias, bispo de Hierápolis, na Ásia Menor, assim escreveu uma geração antes que “sempre que chegava alguém que houvesse seguido os presbíteros, eu lhe fazia inquirições sobre as palavras desses presbíteros, que haviam dito André, ou Pedro, ou Filipe, ou Tomé, ou Tiago, ou João, ou Mateus, ou que estavam dizendo Aristião, e o presbítero João, ou qualquer outro dos discípulos do Senhor. É que eu nunca supus sequer, que as informações oriundas de livros me ajudariam tanto quanto as palavras oriundas de uma voz viva, sobrevivente” Irineu, Against Heresies., 3.3.3; ANF 1.416

                   

[2] Irineu, perto do fim do segundo século, escreveu a respeito “daqueles que tinham grande familiaridade com João, o discípulo do Senhor, (afirmando) que João transmitira aquela informação, i.e., a respeito da idade de Jesus e a extensão de seu ministério. E permaneceu entre ele até a época de Trajano”  Acrescenta ainda, que “a igreja de Éfeso, fundada por Paulo, e tendo João permanecido entre eles de forma perene, até os tempos de Trajano.