Pela força de Javé
Violência e Guerra Santa
Na leitura dos livros de Josué e dos Juízes, deparamos com a violência. Como entender a guerra de extermínio que quer eliminar sem mais todos os cananeus, os antigos habitantes da Palestina? Um dos exemplos mais conhecidos é o relato da tomada de Jericó (Js 6.17-21). Trata-se de um Deus violento? Exterminador?
As cidades cananéias de então tinham um exército profissional casta guerreira, que era recrutada de modo mercenário para a defesa do sistema.
As tribos de Israel, por seu lado, não tinham exército profissional nem mercenário. Cada tribo e clã tinha um número de homens aptos para a guerra que, na hora de um perigo, se uniam para defender o bem comum, como o exigia a aliança concluída com Javé: protetor dos fracos e laço de união do povo.
Deste modo, a guerra chegava a ser inseparável da vida das tribos que lutavam para manter sua unidade sagrada em torno de Javé e a defendiam contra a ameaça de opressão das cidades cananéias.
O povo de Israel não combatia para conseguir um novo espaço vital, mas para manter sua união e independência compreendidas como dom de Deus e sinal de sua graça. Combatia na certeza de que a força de Javé o acompanhava. A guerra não era sacralizada como elemento separado da vida. A vida toda é que era sagrada, vista como santa a ser defendida nem que fosse por meio da guerra.
A narrativa da tomada de Jericó (Js 6) foi compilada por volta do século VII a.C., no ambiente deuteronomista. Esta corrente de pensamento reinterpretava a história de Israel à luz dos acontecimentos vividos na época compreendida entre a reforma do rei Josias e o Exílio na Babilônia.
O relato revela uma atitude clara com o povo de Javé contra a influência da religião tanto dos cananeus da Palestina como do Rei da babilônia. Por isso, a teologia deuteronomista mudou o antigo sentido do chamado “anátema” (extermínio) (em hebraico herrem:Js 6.17; 7.1-26.
Antes era compreendida como renúncia aos despojos, que passavam a pertencer a Javé. Os soldados lutavam gratuitamente e entregavam tudo o que conseguiam. Nesta “guerra santa”, destruíam-se os bens e as pessoas contrárias ao modo de vida participativa e igualitária, das tribos de Israel. Mas não se matava todo o povo, toda a cidade; só os chefes. Assim, a guerra era posta a serviço de um bem mais elevado: a paz entre vencedores e vencidos, o fim da desigualdade entre campo e cidade (1Sm 15).
Mas na leitura deuteronomista, o “anátema” passou a significar “extermínio total”, “terra arrasada”, incluindo os inocentes como oferenda a Javé, que havia ajudado o povo a apoderar-se violentamente de Jericó e das outras cidades da Palestina (cf. 6.17-24;10.28-42). O que a teologia deuteronomista quer atingir é uma tomada de posição firme e radical no combate à idolatria Cananéia que punha em perigo as bases da fé
Para nós, hoje, é importante distinguir o contexto em que ocorreram os fatos e o contexto da memória que deles se fez no século VI a.C. Assim compreende-se melhor a ação de Javé com seu povo em favor da justiça.
Pelo já exposto, pode-se concluir que a mais importante motivação para as lutas pela terra da Palestina não era tanto a conquista d um novo espaço geográfico, mas sobretudo manter a independência e a união das tribos. Além disso, o Deus de Israel não é conhecido como aquele que arrasa vingativamente todos os inimigos, mas como alguém que tem predileção pelos mais pobres e oprimidos, pelos habitantes da montanha. Ele se faz presente na luta deles pela vida e os anima.
Finalmente, vale notar que a Bíblia, nos livros de Josué e Juízes, não nos dá uma solução acabada com respeito à violência. Do que foi dito não se podem tirar “receitas” tão diretas. Nem para apoiar os grupos armados, nem para sustentar posições pacifistas. É sempre necessário recorrer à análise da situação com a seriedade das ciências sociais, à luz da Palavra de Deus, tanto do Antigo Testamento como do Novo. Só a partir daí se podem tomar atitudes historicamente responsáveis, com base na Escritura. E ainda assim poderemos nos equivocar. Donde a necessidade de um discernimento eclesial contínuo, no qual tem lugar o magistério e a tradição. Respeitando-se o maior Intérprete de todos os tempos; o Espírito Santo, o que, muitos "pseudo-teológos" não possuem, daí a orígem das falácias.
Que Deus, o Senhor, tenha de nós piedade e nos ajude a enxergar o que não enxergamos com os olhos naturais.
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