De escrava a rainha 2.8-18
Por decreto, as moças são levadas, isto é, obrigadas a ir para a fortaleza de Susa. Ester entre elas. Não vai de livre e espontânea vontade, mas obrigada, como escrava dentro de um regime de opressão em que tudo pertence em primeiro lugar ao rei. Ficam sob a guarda e os cuidados de Egeu, o eunuco-chefe do harém do rei.
Começa a ascensão de Ester. O primeiro a gostar dela é o próprio Egeu, que lhe dá tratamento especial; enfeites, comida, sete escravas, aposento melhor etc – torna-se a sua protegida. A beleza de Ester, e certamente a sua personalidade, começa a abrir caminho. É a maneira de Deus agir, preparando a grande libertação para o povo.
Mardoqueu continua o tutor de Ester . Ela segue obedecendo a seu pai de criação, mantendo as raízes. Isso mostra que o povo dominado permanece fiel à sua história e tradição. O conselho de Mardoqueu é que ela mantenha em segredo o povo e a família a que pertence. São as raízes que permanecem escondidas, por enquanto. Ë a situação dos pobres que vivem num sistema de dominação: para sobreviver devem manter em segredo a sua identidade. Nesse espaço íntimo o poderoso opressor não poderá penetrar. No mais íntimo o povo pobre guarda a sua fidelidade a Deus e ao seu povo. Ambos são representados aqui. Enquanto Mardoqueu a acompanha todos os dias (o povo), Deus prepara os acontecimentos em vista de beneficiar o seu povo fiel.
No harém preparatório há um regulamento das mulheres. Nele certamente estavam todas as regras para pertencer ao harém do rei, incluindo etiquetas de educação e, principalmente, o preparo físico por 12 meses com os melhores produtos: perfumes, cremes etc. Isso porque no harém a mulher ficava reduzida ao seu corpo, que devia Ter a melhor forma para agradar os caprichos do rei.
Não se tratava apenas de caprichos sexuais, mas principalmente caprichos de poder e status. Na antigüidade o fato de poder ter muitas mulheres indicava o status social do homem. O harém era uma espécie de tesouro pessoal. Quanto mais mulheres, mais status, mais elevado nível social. E o rei devia estar acima de todos os outros homens. Deveria, portanto, ter um harém muitíssimo bem povoado.
Como ficava a mulher no harém?
Mera coisa, mero objeto. O destino de cada uma era passar uma noite com o rei e, no dia seguinte, ser transferida para outro harém, chefiado por Sasagaz. E então a mulher ficava ao sabor de alguma lembrança eventual do rei. Podia ser até que nunca mais o visse. Ficava como moeda trancada num cofre, um número apenas para que o rei ostentasse a sua grandeza pessoal. Em outras palavras, uma prisão de ouro para o resto da vida.
Chega a vez de Ester. Só agora se diz que era filha biológica de Abiail, nome hebraico que significa “meu pai é forte, é guerreiro”. Nesse momento crítico de se dirigir ao opressor, a raiz biológica de Ester é lembrada para dizer que ela vai ser protegida, e protegida por Deus, já que o nome também é aplicado a Deus, significando “meu Deus é forte, é guerreiro”. Outro sinal da ação escondida de Deus.
Ester é simples. Podia pedir tudo o que desejasse para agradar o rei, mas contenta-se com o que recebera de Egeu. Ela não precisa de ornamentos especiais, pois sua beleza pessoal não requer enfeites externos.
E esta parte se encerra com o quarto banquete. Trata-se, porém, de um banquete em honra de Ester, a escrava que se tornou rainha. Ao contrário dos outros banquetes que ostentavam a opressão, a divisão e a exploração, este abre uma perspectiva nova. Em comemoração, o rei dá presentes e concede um dia de descanso. É a forma de dizer que o imposto sobre a produção daquele dia não será cobrado. A situação dos judeus, portanto, já começa a clarear: mal chegando ao trono, a rainha Ester já começa a mudar a situação do seu povo. Enquanto Assuero vive a serviço de si mesmo, Ester desde o início vive a serviço do seu povo. Sinal de novidades que virão pela frente, pois a verdade e a justiça entraram com Ester no mais alto escalão do governo persa. Por meio dela Deus vai começar a agir.
Ester já conquistara Egeu. Agora conquista a simpatia de todos os que a conhecem . É a preparação para uma conquista maior: as boas graças do próprio rei, que é o que acontece. Ester, contudo, é levada até o rei. Vai contra a própria liberdade. E o rei não só a acolhe como a preferida, mas também como esposa e rainha. E o autor faz questão de frisar que é o mês de Tebet, o décimo do ano persa, entre dezembro e janeiro. Naquela região é o mês mais frio e escuro, e a natureza como que morre. É esse clima lúgubre que marcou a ascensão de Ester para junto do rei opressor. Ela carrega consigo a opressão do seu povo, simbolizado pelo clima hostil.
Mardoqueu descobre um complô contra o rei. Como porteiro do palácio, (o texto diz literalmente, que ele “ficava sentado à Porta Real” – o que significa alto cargo, certamente o de chefe de funcionários) Mardoqueu também vigiava a sorte de sua prima. Um dia ele ficou sabendo de um complô contra a vida de Assuero. Um dia ele ficou. Comunicou isto a Ester, que fez com que o rei o soubesse, salvando-lhe a vida.
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